Setor sucroenergético e associação de distribuidoras debatem sobre venda direta de etanol para postos

São Paulo, 27 de agosto de 2018. Representantes do setor sucroenergético e das distribuidoras de combustíveis se reuniram na Associação Comercial de São Paulo (ACSP) na última quinta-feira (23) para discutir a possibilidade de usinas venderem etanol diretamente aos postos de abastecimento. O encontro foi organizado pelo Conselho de Infraestrutura da ACSP.

A ideia da venda direta não é nova. Há alguns anos, o segmento cogita a possibilidade. Contudo, foi a partir do começo deste ano - quando o etanol hidratado sofreu uma forte queda no preço, na ordem de R$ 0,46 por litro - que um plano começou a tomar forma, em especial por parte da Federação dos Plantadores de Cana do Brasil (Feplana).

A União da Indústria de Cana-de-açúcar (Unica) se opõe à venda direta. Presente no seminário na ACSP, Antônio de Pádua Rodrigues, diretor-técnico da Única, ressaltou que o setor vive uma crise, o que tornaria inviável uma mudança no sistema de comercialização do etanol. “Hoje um terço do setor não tem solução, um endividamento superior ao seu faturamento. O endividamento médio das usinas é de R$ 150 por tonelada de cana”.

“Temos hoje talvez o melhor sistema de distribuição e logística do mundo num país continental. São custos baratíssimos. Quando você escuta [de quem defende a venda direta] que ela vai reduzir em 10% o preço na bomba, é uma mentira muito grande. Eu não consigo ver hoje uma redução muito diferente de um, dois, três centavos ao consumidor”, criticou Rodrigues.

Para ele, embora a operação de venda direta possa existir, ela é muito restrita e de pouca viabilidade. No entendimento do diretor da Unica, a comercialização livre de intermediários estaria restrita aos postos “bandeira branca” e, mesmo assim, não haveria quantidade suficiente de postos no raio de atuação de uma usina capaz de absorver toda a sua produção. Isso já obrigaria a usina a ter que continuar lidando com as distribuidoras, que comprariam o restante do etanol.

Posicionamento semelhante tem Hélvio Rebeschini, diretor de planejamento estratégico da Associação Nacional das Distribuidoras de Combustíveis, Lubrificantes, Logística e Conveniência (Plural), que representa as maiores empresas do segmento. Ele afirmou que as distribuidoras de combustíveis atuam de maneira altamente eficiente e citou a crise dos caminhoneiros como “prova de fogo” que respaldou o valor dessas empresas para a economia brasileira. “No momento em que os bloqueios das bases de distribuição deixaram de existir, em três dias o Brasil estava com combustível irrigado. E, em cinco dias, 95% dos postos estavam com produto. É um setor preparado”, argumentou Rebeschini. Segundo o diretor, a paralisação não foi motivada por problemas ligados ao preço do diesel e da gasolina, mas sim por uma relação entre excesso de oferta de frete e baixa demanda de carga. “É uma crise do país”. 

Ainda no entendimento da Plural, a venda direta traz prejuízos ao consumidor e é uma proposta que tem sido feita de maneira “açodada”. Rebeschini disse que a operação direta representará perda de eficiência logística de R$ 470 milhões, aumento médio de 10 horas no tempo de carregamento das usinas, incremento de R$ 410 milhões de custos operacionais e elevação significativa de caminhões nas ruas, o que significaria mais emissões de CO2 e acidentes nas estradas. “Além disso, hoje existe uma estrutura preparada de armazenamento na entressafra, tanto nas usinas, mas em especial no setor de distribuição, inclusive com regras da própria ANP em que temos que comprovar os níveis de estoque ao final de cada mês”, disse o diretor da Plural, justificando que a venda direta, por dividir responsabilidades, não garantiria abastecimento contínuo ao longo do ano. “No final, o preço vai aumentar, e não cair como andam dizendo”.

Contraponto

Rebatendo os argumentos da Unica e da Plural, o diretor-técnico da Feplana defendeu que o impedimento à venda direta é um bloqueio à livre iniciativa. “Não queremos a obrigatoriedade de vender diretamente, mas que haja a opção. Dizem que não é viável economicamente, mas como sabem, se nem a unidade pode fazer esse cálculo?, questionou José Ricardo Severo,

Ele reconheceu que as distribuidoras têm papel importante na cadeia produtiva do setor e que não é fácil montar uma distribuidora no País porque a atividade requer ação em grande escala. “Mas vemos muitos caminhões saindo das unidades industriais, passando por postos próximos, tendo que viajar 400km e terem de voltar depois para esses mesmos postos que estavam a poucos quilômetros de distância”.

Segundo pesquisa da EsalqLog mostrada por Severo em sua apresentação, o custo médio do transporte do etanol hidratado no Estado de São Paulo cairia de R$ 89,09/m3 para R$ 60,77 /m3. Ele rebateu a fala de Rebeschini, dizendo que o preço ao consumidor cairia, sim. “Em Brasília, onde os postos de gasolina entraram na Justiça contra a distribuidora da Petrobras por formação de preço, você compra o etano, fora de Brasília, por R$ 1,20 mais barato. Então tem que ter concorrência e liberar essa questão para novos investidores”.

O diretor da Feplana comentou que, quando a unidade industrial vende diretamente para o posto, isso acarreta em aumento de riqueza na região, contribuindo para o desenvolvimento local. Além disso, a operação direta representaria garantia de qualidade, pois o posto saberia exatamente a origem do produto comercializado. “Tratam como se todo o País fosse operar no modelo de venda direta. Mas a gente acredita que isso não chega a 10% do mercado”, disse Severo.

“Nós aqui da ACSP estamos preocupados com a questão. Temos feito alguns trabalhos e reuniões para buscarmos uma política que dê maior transparência aos preços de combustíveis. Esse é um setor que precisa ser competitivo e alinhado ao mercado internacional. Necessitamos com urgência adotar uma política que atraia investimentos”, disse Luiz Gonzaga Bertelli, coordenador do Conselho de Infraestrutura da entidade. 

 

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Por ACSP