
O Conselho de Altos Estudos de Finanças e Tributação (CAEFT/ACSP) promoveu, ontem (14), reunião com palestra sobre ESG e tributação na era Trump, conduzida pelo coordenador do CAEFT, o professor dr. Luiz Eduardo Shoueri, e realizada pela professora dra. Elídie Palma Bifano, da FGV, que integra vários conselhos fiscais e comitês de auditoria, além de atuar como advogada, e pelo prof. dr. Fábio Gaspar, advogado e docente de Direito Tributário, especialista em sustentabilidade e ESG e diretor tributário da Shell Brasil.
O encontro foi aberto com questões colocadas em debate pelos especialistas e por Shoueri, encaminhadas para os palestrantes. Entre os temas, a questão da Reforma Tributária, a perda de receitas municipais e como isso pode impactar, no longo prazo, na regulamentação das práticas ESG e benefícios tributários nos municípios.
Embora seja uma questão que deve ocorrer no longo prazo, existe uma preocupação dos prefeitos das grandes cidades em relação à perda da receita e cobram equilíbrio e mais compensação à Confederação Nacional dos Municípios. Citaram a necessidade de simplificação das normas da legislação e da elaboração de uma regulamentação que contribua para uma menor judicialização e melhoria do ambiente de negócios.
ESG, ASG no Brasil
Bifano abriu a palestra mostrando alguns dados e como o ESG tem sido tratado nas empresas privadas e pelo poder público, mostrando o cenário atual no Brasil e no exterior, considerando os impactos do negacionismo do governo Trump. “Sem dúvida, as decisões de Trump em relação ao meio ambiente estão provocando um retrocesso. Algumas empresas americanas já deixaram de destacar suas ações de ESG, mas as práticas propostas pelo ESG continuarão a existir. Estão consolidadas”.
A advogada fez também uma breve definição do ESG ou, na tradução para o português, ASG, Ambiente, Sustentabilidade e Governança, que já é utilizado pelas empresas. “Muito do que falamos aqui tem muito da nossa experiência pessoal. O ESG nasceu entre pessoas e não de uma lei”, afirma. “Banqueiros e empresários começaram a pensar na questão do meio ambiente e sustentabilidade, na década de 1990, usando, por exemplo, o papel reciclado no talonário de talões de cheque ou em formulários. O Banco Boston foi o pioneiro na construção, também na década de 1990, de um prédio sustentável com redução do consumo de água e energia desnecessários”.
ESG, uma breve história
Gaspar fez uma apresentação dos pontos da trajetória do ESG desde o seu início. E começa em 1970, lembrando que o economista norte-americano Milton Friedman citava em seu trabalho “Shareholder Capitalism”, algo como o capitalismo dos acionistas, no qual afirmava que a única responsabilidade das empresas é gerar lucro para os acionistas.
O primeiro contraponto a Friedman veio na década de 1980, quando outro economista, Robert Friedman, que produz um novo livro sobre o tema, “O Capitalismo de Stakeholders”, ou (capitalismo das partes interessadas, em tradução livre), incluindo os funcionários das comunidades, público consumidor e o meio ambiente, como alvo dos benefícios gerados pelas empresas privadas. Também nessa década, lembra o professor Gaspar, “foi importante a Fundação do Global Reporting Initiative – GRI, que leva em consideração práticas para o meio ambiente e governança corporativa”. Na década de 2000, destacamos o lançamento do Programa Who Cares Wins pela ONU; na de 2010, o Movimento ‘Fair Share’, BEPS e ODS: programas voltados para fortalecimento dos laços entre tributação e ASG; nos anos 2010, a Cristalização da tendência de Soft Law virar Hard Law; nos anos 2020, leis mais leves tornam-se mais efetivas.
Avanços na legislação internacional e no Brasil
- Public CbCR (EU Directive 2021/2101): obriga companhias operando na UE a publicarem tributos pagos por país (Declaração País-a-País);
- Corporate Sustainability Reporting Directive (EU Directive 2022/2464): exige que grandes empresas divulguem informações sobre seu desempenho ambiental, social e de governança para aumentar a transparência e a responsabilidade corporativa;
- Corporate Sustainability Due Diligence Directive (EU Directive 2024/1760): exige que as empresas identifiquem, previnam e mitiguem impactos adversos sobre os direitos humanos e o meio ambiente em suas operações e cadeias de suprimentos;
- Normas brasileiras que privilegiam o ASG (programas de conformidade fiscal (i.e. Cofia), societárias, transação sobre crédito público, tributos verdes a serem abordados mais à frente);
- EC n. 132/2024: altera a Constituição Federal do Brasil, trazendo diversos conceitos de A, de S e de G: proteção ao meio ambiente (A), devolução de tributos a cidadãos de baixa renda (S) e maior transparência fiscal e avaliação econômica e de simplicidade na elaboração de leis (G).
Relatórios de sustentabilidade
Bifano retomou a fala sobre o cenário brasileiro como as empresas e as entidades estão tratando a ASG. “É importante prestar atenção nos chamados Relatórios de Sustentabilidade produzidos pelas empresas, pois mostram como estão sendo distribuídos os recursos gerados pelas companhias e sua distribuição nos pontos do ASG”.
Padrão ASG na produção dos relatórios tem contribuído com a governança na gestão das empresas. “Temas como evitar o desperdício, reutilização dos produtos, enfim, ações que contribuam para o meio ambiente e que tragam benefícios para a sociedade civil estão contemplados nesses relatórios anuais”.
A advogada também citou os relatórios de transparência fiscal: fatos tributários e correspondentes ações, evidenciação do valor agregado em matéria de tributos. E a portaria da Câmara de Valores Mobiliários (CVM 193), obrigando a elaboração e divulgação de relatório de informações financeiras relacionadas à sustentabilidade.
Desempenho potencializado
Finalizando sua apresentação, o professor Gaspar mostra que, de acordo com a pesquisa da Stoxx Europe 600, índice de ações de empresas europeias, empresas engajadas em ASG apresentam um valor médio de 20% sobre o valor de suas ações, em comparação com as menos engajadas. Além disso, tiveram um Retorno sobre o Investimento (ROI) 15% superior em um comparativo de cinco anos, em conformidade com dados da European Investment Bank (report on ESG desempenho in Europe).
Também vale destacar a adoção de princípios de boas práticas tributárias e a publicação do primeiro Tax Contribution Report (2019) com a divulgação voluntária dos tributos pagos, valores investidos e número de funcionários por país.
Efeito Trump
A conclusão dos dois palestrantes é que as boas práticas vieram para ficar, pois nasceram de movimentos das empresas. As ações de um país não devem afetar os demais e os negócios internacionais. A conscientização das empresas é relevante (companhias abertas brasileiras). E os consumidores? É necessária conscientização ainda maior. E os incentivos fiscais? Sobre a era Trump: o presidente americano passará e o ASG ficará. Nesse momento, o representante dos Estados Unidos significa um retrocesso, mas já existem ações para se contrapor às suas políticas para o setor, especialmente na União Europeia.
Fotos: https://flic.kr/s/aHBqjC8SJo
Por ACSP - 15/04/2025