
Para debater as matérias tributárias em tramitação no Congresso Nacional, a Associação Comercial de São Paulo (ACSP) reuniu, na quarta-feira (11), representantes de entidades de vários setores da economia para discutir o PL 1087/25, a reforma do imposto de renda e a tributação dos dividendos, o andamento do projeto de Reforma Tributária e o aumento do IOF. O encontro, conduzido por Marcel Solimeo, economista-chefe do Instituto de Economia Gastão Vidigal (IEGV) da ACSP, contou também com as palestras de Sarina Sasaki Manata, assessora da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), José Clóvis Cabrera, consultor tributário, e Felipe Scudeler Salta, economista-chefe e sócio da Warren Renascença Investimentos - Serviços Financeiros.
Com a perspectiva de relevantes impactos sobre a burocracia e de maiores encargos às empresas, o evento foi uma oportunidade para trocar informações e estabelecer estratégias de atuação por conta da natureza fiscal que se apresenta no futuro. “O objetivo é homogeneizar os conhecimentos”, declarou Solimeo. Para ele, “as alternativas [apresentadas pelo governo] não são para não aumentar imposto, são alternativas buscando outras formas de tributar”.
A primeira palestra foi sobre o PL 1087/25, apresentada por Sarina Sasaki Manata. A representante da FecomercioSP, ao explicar que o projeto prevê, em linhas gerais, isenção para as pessoas que ganham até R$ 5 mil e redução para quem ganha entre R$ 5 mil e R$ 7 mil, destacou que “na verdade, não se propõe a atualização da tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física, há anos defasada. O que se propõe é uma grande complexidade para se obter esse mesmo resultado [de arrecadação]”. Para os contribuintes com rendimentos acima de R$ 7 mil, não sofreria qualquer alteração, aplicando-se a tabela do IR existente.
Ela também mencionou a definição de altas rendas. Pessoas com rendimento mensal de até R$ 50 mil não teriam adicional de tributação. Contudo, para aqueles que ganham acima, seria aplicada uma retenção de 10% por mês. “Isso vai ser verificado na somatória das vendas. Então, você vai pegar uma pessoa que recebe de uma pessoa jurídica, e eu acho que o grande foco aqui é, realmente, a distribuição de lucros e dividendos”.
Sarina indagou sobre a adequação desse limite, argumentando que R$ 50 mil já é debatível como uma alta renda e que, com o passar do tempo, esse parâmetro pode se tornar ainda mais questionável, especialmente diante da falta de atualização dos valores ao longo dos anos. “Tem uma previsão de rendimentos que você pode eliminar para determinar essa alíquota mínima, sendo até 10%, tira ganhos de capital, herança, doação e rendimentos recebidos acomodadamente”, disse.
“E daí tem outra regra para deduzir a base de cálculo, exclui outros rendimentos, como aposentadoria e pensão, as indenizações de uma forma geral, os ganhos de caderneta de poupança e os lucros de títulos isentos. E aqui quero deixar bem expresso que, exceto ações de participação societária. Então, a gente vê que o grande foco, realmente, apesar de não ter dado esse nome, é, de fato, tributar os lucros e dividendos hoje isentos, desde 1996, inclusive”, indica Sarina.
Ela também pontuou que a proposta estabelece uma alíquota nominal de 34% para o imposto de renda e contribuição social das empresas em geral, mas a alíquota efetiva é frequentemente menor, com muitas empresas pagando cerca de 22% devido a deduções e isenções.
A palestrante trouxe algumas propostas da FecomercioSP para a matéria. Para pessoa física, atualização da tabela progressiva do IRPF e correção dos valores nominais das deduções legais. Já para a pessoa jurídica, redução das alíquotas de IRPJ e CSLL; não incidência do IR sobre os lucros de anos anteriores; e isenção para ME e EPP com receita anual de R$ 4,8 milhões.
Em seguida, foi a vez de tratar da Reforma Tributária, apresentada por José Clóvis Cabrera. O consultor tributário, após fazer um resgate histórico do tema, abordou o Projeto de Lei Complementar (PLP) 108/24, contido em todo o bojo da reforma, que trata do Comitê Gestor do Imposto sobre Bens e Serviços (CG-IBS). Ele dispõe sobre o processo administrativo tributário relativo ao lançamento de ofício do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), sobre a distribuição do produto da arrecadação do IBS aos entes federativos e sobre o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITCMD).
Antes de aprofundar-se no tema, Cabrera destacou que, para a implementação da Reforma Tributária, ainda faltam tramitar os PLPs do imposto seletivo e dos fundos, este último para compensar a extinção gradual de incentivos fiscais concedidos pelos estados e para financiar investimentos em desenvolvimento regional. Os fundos previstos na Emenda Constitucional 132 são:
Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais – compensar os detentores de benefícios fiscais que serão eliminados com a implementação do IBS em 2032. Ele será custeado pela União, no valor de R$ 160 bilhões, e funcionará de 2029 a 2032.
Fundo de Desenvolvimento Regional – promover o desenvolvimento econômico das regiões mais pobres do Brasil. Ele começará com R$ 8 bilhões, em 2029, aumentando gradativamente até R$ 60 bilhões, em 2042. A distribuição desses recursos seguirá os critérios de 30% por população e 70% pelo Fundo de Participação dos Estados (FPE).
Fundo de Combate à Pobreza – manter e direcionar recursos para programas de combate à pobreza, com foco em regiões mais vulneráveis.
Segunda Receita – retenção de 5% da receita do IBS para repassar aos estados que sofrerem perdas devido à transição para o princípio do destino. O fundo ajudará a garantir que os estados não sejam prejudicados durante a implementação do novo sistema tributário, com a distribuição até 2077.
Fundo de Sustentabilidade e Diversificação Econômica do Estado da Amazônia – será definido em lei complementar e incluirá um fundo à Amazônia Ocidental e Amapá.
Sobre o Comitê Gestor do IBS, ele será uma entidade pública com caráter técnico e operacional, sob regime especial, com sede e foro no Distrito Federal. Ela será dotada de independência técnica, administrativa, orçamentária e financeira, relativamente à competência compartilhada para administrar o IBS.
Algumas das funções e competências do órgão são: editar regulamento único e uniformizar a interpretação e aplicação da legislação do IBS; arrecadar o IBS, efetuar as compensações, realizar as contenções previstas e distribuir aos estados, Distrito Federal e municípios; atuar junto ao Executivo Federal para harmonizar normas, interpretações, obrigações acessórias e procedimentos relativos às regras comuns aplicáveis ao IBS e à CBS, entre outros.
O Comitê Gestor do IBS será formado por um Conselho Superior, Diretoria-Executiva, Secretaria-Geral, Assessoria de Relações Institucionais e Interfederativas, Corregedoria, Auditoria Interna, além de outras diretorias.
“A composição do Conselho Superior será de 27 membros e respectivos suplentes, representando cada Estado e o Distrito Federal, indicados pelos chefes dos Poderes Executivos respectivos”, apontou Cabrera. “Serão 14 representantes eleitos com base nos votos de cada município e 13 representantes eleitos com base nos votos de cada município, ponderados pelas respectivas populações”.
A União custeará, por meio de operação de crédito, as despesas necessárias para instalação do CG-IBS, de 2025 a 2028, no montante de até R$ 3,8 bilhões.
Fechando o ciclo de palestras, Felipe Scudeler Salta iniciou a sua exposição expondo suas dúvidas sobre o êxito do CG-IBS. “Esse Comitê Gestor tem chances zero de dar certo”, cravou. Para basear sua opinião, ele apontou a complexidade e configuração administrativa do órgão e o comprometimento da federação ao permitir que auditores de diferentes estados julguem infrações de empresas de outras localidades.
Salta também criticou o fato de haver um comitê em Brasília gerenciando a arrecadação e a resolução de conflitos entre contribuintes e o fisco, afirmando que “vamos ter uma situação absolutamente ingovernável”. Para ele, “não tem o menor cabimento” essa estrutura proposta.
Ao falar da questão do IOF, ele criticou a ausência de propostas eficazes de redução de gastos pelo governo. Sobre o primeiro conjunto de ações do IOF, Salta argumentou que “mostra o governo, de fato, sem uma agenda e propostas”. O que falta ao governo, em sua visão, é discutir a revisão da despesa pública, sendo esse o principal problema fiscal.
Além disso, o palestrante trouxe algumas sugestões de medidas fiscais para enfrentar o déficit orçamentário. Uma delas é a vinculação da saúde e educação aos indicadores de receita. “Se você tocasse a vinculação à receita pela correção pela inflação, como preconizava a Emenda 95, de 2016, e como vigorou no País até dezembro de 2022, você economizaria R$ 20 bilhões por ano”.
Com a indexação da previdência entre os gastos sociais, por exemplo, salarial do seguro-desemprego ao salário mínimo, seriam R$ 35 bilhões por ano. Com o corte de 10% dos gastos secundários, a economia seria de R$ 55 bilhões. Corte pela metade das emendas parlamentares e do Plano Safra também foram outras propostas.
Sobre as medidas tomadas pelo governo na questão do IOF, Salta criticou as medidas, ressaltando que “não é assim que se faz a justiça fiscal”. Ele lembrou que as ações do governo em relação ao IOF não resolvem os problemas financeiros, destacando a grave situação fiscal do Brasil e um déficit significativo.
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Por ACSP - 11/06/2025