Associação Comercial relembra e debate os 100 anos da “Revolução de 1924”

São Paulo, 19 de junho de 2024. A Associação Comercial de São Paulo (ACSP), instituição que teve papel importante durante os 23 dias do conflito de 1924, por intermédio de diversas iniciativas do então presidente José Carlos de Macedo Soares, reviveu o “Levante de 24” em um debate realizado em sua sede, ontem (18/06), das 15h às 17h, presencial e virtualmente, promovido pelo Comitê de Civismo e Cidadania (COCCID), cuja temática foi “100 anos da Revolta Histórica de 1924: a revolução esquecida – o papel das instituições na reconstrução de São Paulo”.

No próximo dia 05 de julho, a “Revolução de 1924” completará 100 anos. Mesmo centenária, ela é retratada por muitos historiadores e estudiosos do período como “esquecida”, se a compararmos com outras ocorridas no Estado, a exemplo da “Constitucionalista de 1932”. Segundo o jornalista e historiador Moacir Assunção, um dos palestrantes convidados, trata-se de “uma das maiores batalhas urbanas do Brasil”, e quase não é conhecida e mencionada por paulistas e paulistanos e demais brasileiros.

"Com alegria, participo desse debate que trata de momento emblemático para São Paulo e mostra o quão necessária e atuante a ACSP se mostrou naquela época em prol do empresariado e dos cidadãos", declarou Roberto Mateus Ordine, presidente da Associação Comercial, anfitrião do evento ao lado de Samir Nakhle Khoury, coordenador do COCCID.

Durante as duas horas de debate, os palestrantes Moacir Assunção, autor do livro “São Paulo deve ser destruída: A História do Bombardeio à Capital na Revolta de 1924”; Dácio Nitrini, jornalista; João Tomas do Amaral, presidente do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo; e Gilberto Marques Bruno, membro do COCCID e diretor do Centro das Tradições de Santo Amaro (CETRASA), relembraram a “Revolta Paulista” e enalteceram o papel de instituições, como a ACSP, que contribuíram para atenuar os estragos e o caos causados na cidade, que foi parcialmente destruída.

De acordo com Assunção, durante o conflito armado, com frentes de batalha em vários bairros da capital paulista, sobretudo na zona leste (Penha, Vila Matilde, Belenzinho e Mooca) e também na zona central (Cambuci e Brás), casas e prédios foram demolidos, muitas explosões de bombas, ataques aéreos, soldados armados, população assustada, tanques de guerra cruzando a cidade e trincheiras abertas nas ruas.

Ao todo, foram 503 mortes; 4.864 feridos; 300 mil cidadãos abandonaram a cidade; 1.800 prédios destruídos; 3.500 rebeldes; e 18 mil soldados do Exército. Para se ter uma ideia, a Revolução de 1932 contabilizou 634 mortos em 03 meses de conflito, e a de 1924, quase o mesmo número de baixas, mas em 23 dias. “Muita gente morta. Uma guerra! A cidade foi bombardeada de forma desgovernada numa ferocidade dos combates, a mando do presidente Arthur Bernardes”, explicou Assunção, complementando que o título do seu livro “São Paulo deve ser destruída” é uma menção à fala do então Ministro da Guerra (Defesa) que, na época, acrescentou: “São Paulo será reconstruída, mas a República não pode ser arranhada”.

O historiador apontou que algumas instituições atuaram para minorar os efeitos da guerra urbana e a ACSP, por exemplo, intermediou os primeiros contatos entre o então prefeito da capital Fermiano Pinto Morais e um dos chefes revolucionários, Isidoro Dias Lopes, para que se restabelecesse o controle policial nas ruas com o objetivo de coibir os saques a lojas. Dessa intermediação, formou-se uma “Guarda Cívica”, que ficou responsável pelo policiamento da cidade.

Outra providência intermediada pela ACSP, com atuação do então presidente Macedo de Moraes, foi a criação de uma comissão de abastecimento encarregada de estabelecer uma tabela de preços dos gêneros alimentícios e controlar os estoques existentes na cidade, procurando evitar a especulação e monopólios, garantindo, assim, a ordem social.

Moacir Assunção relata ainda que Macedo Soares pediu permissão ao comandante revolucionário para estabelecer contatos com o Governo Federal para que houvesse a decretação de feriado bancário, o que foi atendido prontamente, proibindo a abertura de bancos e cartórios, evitando assim as consequências legais para diversas empresas que tinham dívidas e compromissos a saldar.

Além disso, a Associação Comercial, junto a outras instituições, irmandades religiosas, escoteiros e associações privadas organizaram turmas de socorro, de distribuição de alimentação, cozinhas públicas, serviços de transporte e todo tipo de providências para minimizar os sofrimentos da população.

Macedo Soares foi um dos mais destacados dirigentes da Casa, como apresentou Gilberto Marques, esclarecendo que ele se dedicou pelo aperfeiçoamento do empresariado; criou o Departamento de Informações Cadastrais (Central de Proteção ao Crédito); reformulou o estatuto social, com a criação do Conselho Deliberativo; e, na Revolução de 1924, foi considerado um dos líderes da sociedade para o enfrentamento da guerra urbana, como citado nos parágrafos acima, tendo redigido manifestos pela cessação do conflito e elaborado carta solicitando um armistício.

Sua atuação, no entanto, foi interpretada como pró-rebeldes, o que lhe rendeu uma detenção de dois meses, no Rio de Janeiro, em 04 de agosto daquele ano, e, ao fim da prisão, um exílio na Europa até 1927, ano em que retorna ao Brasil e é consagrado como presidente de honra da ACSP.

Há muito ainda a ser relembrado da “Revolução de 1924”, como bem observou Dácio Nitrini, que está prestes a lançar sua mais nova obra “Tenentes Rebeldes”, que não será um romance, mas um livro baseado em documentação histórica e pesquisas, com o diferencial do acréscimo de uma narrativa partindo da ótica e biografia dos principais personagens do levante militar. Na obra, Nitrini apresenta algumas curiosidades como o campo de concentração que foi organizado no jardim da Luz para aprisionar os militares que não aderiram ao confronto armado. O livro será lançado na primeira semana de julho deste ano.

Sobre a Revolução

A Revolução de 1924 foi caracterizada por um levante tenentista, que tinha o objetivo de afastar o então presidente da República, Arthur Bernardes, e substituí-lo por alguém alinhado com as reivindicações de um pequeno número de oficiais do Exército até a convocação de novas eleições.

A Revolução começou um pouco antes, com a “Revolta dos 18”, do Forte de Copacabana, no Rio de Janeiro (capital federal), que marcou o início do movimento tenentista, que lutava por questões como melhores salários, valorização dos militares, eleições livres, liberdade de imprensa e diminuição do poder das oligarquias agrárias da República Velha.

Na capital federal dariam um golpe num governo que eles pontuavam como sendo marcado pelo autoritarismo, instabilidade política e sustentado pelos interesses das elites agrárias mineira e paulista, que se revezavam no poder durante o período conhecido como "república do café com leite".

O primeiro manifesto revolucionário, publicado nos jornais paulistas, no dia 10 de julho de 1924, dizia o seguinte:

“[...]o Exército Nacional não pode e não pôde nunca aceitar o governo do dr. Arthur Bernardes [...]por entenderem os seus chefes e orientadores que esse governo não está à altura dos destinos do país e que tem demonstrado praticamente ser a continuação dos governos eivados de vícios que têm dirigido o Brasil nestes últimos lustros. Estes governos de nepotismo, de advocacia administrativa e de incompetência técnica vêm arruinando paulatinamente as suas forças vivas, aniquilando-o interna e externamente.”

A Revolução durou de 05 a 28 de julho de 1924 e teve como consequências: uma enorme repressão, em todo o País, a tenentes, anarquistas e socialistas; a criação de uma legislação de exceção; a fundação de um estado policial; o esmagamento da pequena oposição; e o acirramento dos ânimos, mesmo após o fim do mandato de Arthur Bernardes.

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Por ACSP