Conjuntura: tarifas de Trump podem ser uma oportunidade para o Brasil

A segunda reunião do Comitê de Avaliação da Conjuntura do Instituto Gastão Vidigal da ACSP aconteceu na quinta-feira, 24 de abril, de forma online e contou com a participação dos membros do comitê, empresários e especialistas dos vários setores da economia brasileira. Coordenada pelo economista e professor Edy Luiz Kogut, a reunião, também contou com a participação do economista-chefe do IEGV, Marcel Solimeo, que faz mensalmente uma análise da economia brasileira, avaliando a situação do mercado interno e internacional e a situação macroeconômica.

Agronegócio

As transformações no cenário do comércio internacional vêm mudando. As novas políticas do governo Trump sem dúvida atingem a todos os países. Por outro lado, existe um fator positivo para o Brasil: a safra de grãos desse ano é uma das maiores da história. O clima favorável ajudou o crescimento da safra, garantindo o aumento das exportações. Em relação aos preços, no entanto, existe a influência das variações do dólar que são determinantes. Em 2025, o Brasil deve ter uma produção acima de 300 milhões de toneladas, no melhor ano da história. São notícias boas que levam o País a acreditar num crescimento das exportações em meio à turbulência provocada pelas tarifas norte-americana.

Açúcar álcool e carne

Já o setor sucroalcooleiro não tem um desempenho tão favorável, por conta de incêndios em plantações e perda de parte da safra. O etanol depende do petróleo, representa 50% do mercado e é muito importante considerar esse fator, quando avaliamos a produção em relação à demanda.
O setor de produção de carnes está numa crise estrutural por conta dos preços menores da carne brasileira, com muitas empresas saindo do mercado. Na verdade, o grande problema é que nos Estados Unidos empresas formam um cartel que define os preços internacionais. Países como os EUA vendem com o dobro do preço da carne brasileira. A rentabilidade no Brasil caiu e em alguns casos empurra o produtor para outra atividade, com a transformação de pastagens em áreas agrícolas.
O segmento tem sofrido com algumas recuperações extra judiciais.por conta de médios produtores que investiram ou pretendiam crescer além das possibilidades. Além disso, sofrem com os juros altos que tem prejudicado a todos, com crédito muito caro.  
Em relação à logística as demandas são evidentes, mas o Brasil precisa se preocupar mais com obras que viabilizem e reduzam o custo do frete. Se a produção cresce, mas não tem investimentos na logística, como acontece no País, o setor vai sofrer. Nesse caso, quem está fazendo investimentos é a China, ampliando a estrutura de armazenagem no porto de Santos e investindo na ligação ferroviário com o Pacífico, que deve beneficiar a produção do centro-oeste brasileiro. Outro problema é a questão das invasões que muitas vezes atingem terras produtivas e acabam prejudicando a produção, beneficiando, em alguns casos, os concorrentes internacionais.

 

Indústria da Construção Civil
No setor também é possível encontrar empresas que já sofrem com o endividamento e o seu crescimento por conta do aumento de juros. Os bancos já estão superaplicados com o uso da poupança para o setor. O que existe já é o uso de outros créditos, mais caros, para a indústria imobiliária.

De qualquer forma, no mercado imobiliário da cidade de São Paulo foram lançadas 114 mil unidades, com 63% no programa Minha Casa Minha Vida (imóveis até R$ 350 mil) e 37% outros mercados. Vendas dos imóveis lançados na capital teve um resultado de 59 bilhões de reais no total, com 108 mil unidades vendidas em relação as 114 mil lançadas, o que pode significar mudanças à vista no mercado. Na média houve um aumento de 16% no preço, mas pode-se constatar um aumento de demanda, principalmente em relação às unidades que se enquadram no Minha Casa Minha Vida.

No Interior de São Paulo foram lançadas 66 mil unidades que geraram uma receita de R$ 32 bilhões com 63 mil unidades vendidas. Participação no interior é menor no Minha Casa Minha Vida, com imóveis com preço médio entre 400 e 600 mil. O Estado de São Paulo tem 40% do mercado imobiliário do Brasil e a cidade de São Paulo tem ¼ do mercado imobiliário do Brasil.

No mercado Nacional, 383 mil unidades, sendo 333 mil vendidos e receita de 229 bilhões de reais. A estrutura de funding total de recursos de 132 bilhões de reais. A poupança representa 31%, FGTS com 8% e outros fundings do mercado muito impactados pela subida das taxas de juros. A caderneta de poupança e o fundo de garantia não têm recursos suficientes e o financiamento do comprador pode ser comprometido por conta da alta de juros. Outra questão importante no setor é a falta de mão de obra, mesmo considerando a valorização dos empregos na indústria da construção civil.

Comércio eletrônico
É importante levar em consideração o crescimento do e-commerce, o comércio eletrônico, que continua procurando maneiras de agradar as diferentes demandas dos consumidores. Segundo a Associação de Comércio Eletrônico (ABBCOM) o segmento cresceu 10,5% nos últimos 12 meses, o que gerou um faturamento de 204 bilhões mais de 415 milhões de pedidos com 91, 3 milhões de consumidores. Expectativa é que em 2025 tenha crescimento de 15% com 435 milhões de pedidos. Outros indicadores tem demonstrado crescimento do e-commerce, especialmente nas datas promocionais como Páscoa, Natal e etc.
É importante, por outro lado, avaliar o impacto da IA no varejo de um modo geral, com criação de modelos, ambientes, previsão de estoques e coleta de informações sobre os clientes. Outros modelos de venda estão sendo impactados pelas novas tecnologias, robôs, veículos autônomos e o aumento da relevância das mídias sociais como área de compras. Modelos de transformação digital estão contribuindo para o engajamento do consumidor.
Também se destacam nesse cenário o renascimento do varejo presencial, só que integrados às soluções tecnológicas. Por outro lado, os market places também têm crescido e ampliando sua área de atuação. Os grandes desafios continuam sendo a regulamentação dos produtos, os golpes e a criminalidade nas redes.

Indústria
Em 2024 a indústria cresceu 3,1%, um bom crescimento, no entanto, observamos uma desaceleração no início do ano com uma estabilização na sequência. O que está comandando o crescimento são os bens de consumo duráveis, bens que dependem de financiamento, mesmo considerando os juros altos. Isso se deve à expansão do crédito que está impactando, inclusive na política de juros. O consumidor está preocupado com o valor da prestação, se cabe no bolso, o que garante o aumento da produção. No três setores da indústria o que se prevê para este ano é um crescimento de 1,5%, mesmo considerando que com a política de juros altos o setor de bens duráveis pode desacelerar. A indústria extrativa pode ter um crescimento de até 5%. A preocupação, de qualquer maneira, é com as tarifas dos EUA, que devem aumentar a oferta dos produtos chineses, desviados do mercado americano para o mercado internacional.

Trump
A análise dos especialistas sobre a estratégia de Trump no Comércio Internacional é de que a possibilidade de um desastre no comércio internacional não deve ser descartada. A tentativa de resolver o problema da indústria americana está gerando uma situação de desequilíbrio. O Brasil está se comportando corretamente e se tivermos uma visão mais estratégica, pode ser uma grande oportunidade, o que não descarta a possibilidade de surgirem incertezas para o setor exportador brasileiro.

Por ACSP - 25/04/2025